sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Qual o cardápio?


      O mundo atravessa atualmente um grande paradoxo: o aumento da fome mundial ocorre simultaneamente à expansão da produção agrícola. Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), a produção de alimentos é capaz de alimentar 11 bilhões de bocas, porém a população mundial se aproxima de 7 bilhões e hoje 1 bilhão de pessoas passam fome. Há explicação? Talvez sim.
É preciso entender que o problema da fome não se limita a uma questão de produção de alimentos, o fundamental mesmo é resolver o problema da acessibilidade a esses alimentos. É justamente esse o principal problema, a agricultura parece ter perdido sua função original e está cada vez mais difícil recuperá-la. Essa atividade é responsável por fornecer a subsistência para o ser humano, porém as barrigas estão cada vez mais vazias e as contas bancárias das grandes empresas cada vez mais cheias.
A problemática da fome não é apenas social, muito pelo contrário, envolve aspectos econômicos e políticos, principalmente porque a fome (de lucro) das agroindústrias impede uma verdadeira dedicação em resolver essa mazela.
Para o geógrafo Josué de Castro, a fome é a expressão biológica de males sociológicos diretamente ligados às distorções econômicas e sociais do seu tempo. Entre essas distorções podemos apontar o fato da incompetência ou má vontade política (ou roubalheira mesmo) que atinge grande parte dos nossos governantes. A fome deve ser tratada como uma questão de saúde pública e não deve ser apenas uma preocupação de quem a sofre, deveria ser a discussão central de uma sociedade que se considera humana.
Existe uma norma internacional sobre o direito à alimentação, está no artigo 11 da Convenção Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Segundo essa norma, a fome deve ser eliminada e os povos devem ter acesso permanente à alimentação adequada, de forma qualitativa e quantitativa, garantindo a saúde física e mental dos indivíduos e das comunidades, além de uma vida digna. Tudo isso é muito bonito, mas olhando bem a realidade parece ser fantasia. 
Para Jean Ziegler, relator especial da ONU sobre o direito a alimentação, a fome é definida como insuficiência ou ausência de calorias no organismo. Já a desnutrição é caracterizada pela falta de nutrientes, especialmente de vitaminas e minerais. Grande parte da humanidade sofre os dois processos, mesmo que não saiba diferenciá-los. Em conseqüência disso temos uma população doente, como afirmava o médico grego Hipócrates “a base da boa saúde está no alimento, assim como o princípio da doença está na falta dele, ou na sua baixa qualidade.”
A situação vem se complicando ainda mais nas últimas décadas, principalmente após a crise do petróleo de 1973 e os relatórios que apontam para um aquecimento global. Esses acontecimentos estimularam o desenvolvimento de pesquisas ligadas a fontes de energias alternativas e a produção de alimentos foi inserida nesse contexto.
A demanda por energia renovável desvia a oferta agrícola para bicombustível, ou seja, parte da terra deixa de produzir alimentos e esse processo passa a encarecê-lo. É a famosa lei da oferta e procura. Estamos em uma encruzilhada, precisamos urgentemente nos dedicar a essa questão, é inaceitável que em pleno século XXI o mundo não tenha conseguido resolver uma necessidade básica para a sobrevivência. O primeiro grande desafio é priorizar o problema social e não o econômico. Do ponto de vista econômico a agricultura ou o agroNEGÓCIO vai muito bem, porém socialmente não consegue amenizar  o genocídio silencioso, que é a morte pela falta de alimentos, com milhares de desnutridos pelo mundo, quase que se decompondo, virando adubo para a terra.
Conclui-se, até aqui, que o ser humano não come, mas parece ser comestível.

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